Oi, meu nome é Leila.
Num planeta onde todo mundo acha que se conhece mas ninguém se entende, achei que era melhor eu me apresentar nessa minha primeira (e espero que não última!) coluna num portal de notícias.
Oi, meu nome é Leila, e eu sou cientista.
Não uma cientista dessas de laboratório e jaleco branco; eu sou cientista de conversar com gente e de contar histórias.
E foi contando histórias sobre a ciência que eu recentemente ganhei uma certa notoriedade na internet. Pra minha surpresa, ainda há quem queira saber de ciência! E não qualquer ciência, mas a ecologia política, que se preocupa com o povo, com o poder, e como o que a gente chama de natureza é protegida ou destruída pela ação humana. Em tempos onde tanta gente acha que sabe de tanto assunto, incluindo assuntos socioambientais, deixa eu me apresentar e te explicar por que razão você deve me acompanhar por aqui.
Eu sou uma pessoa de ilhas. Nasci em uma, Upaon-Açu, território Tupinambá, Ilha do Maranhão, São Luís. Tive minha trajetória acadêmica marcada por outra ilha, Fernando de Noronha; E hoje moro numa grande ilha chamada Te Waipounamu, Terra das Águas de Jade, casa do povo indígena Ngai Tahu, no país que você conhece como Nova Zelândia. Como é típico de gente de ilhas, eu sou apegada ao mar. Foi no mar ou perto dele que eu fiz minhas pesquisas: colocando redes pra prender passarinhos migratórios na beira da praia nas reentrâncias maranhenses, morando dentro de uma colônia de aves marinhas numa ilhota de Fernando de Noronha, comendo macarrão feito com água do mar. Também foi no mar e com gente do mar que eu aprendi sobre o uso de cavalos-marinhos em religiões de Matriz Africana - fazendo a primeira monografia desse tipo no curso de Ciências Biológicas da UFMA. Na água doce eu aprendi sobre os campos alagados, entrando em canoas nos lagos da Baixada pra acompanhar a caça de Jaçanã e as dificuldades dos pescadores que estão cada vez mais cercados pelo arame farpado das fazendas. Seguindo os rios Pindaré, Itapecuru, e Mearim, conheci povoados e cidades onde ainda se faz tapiti e choque, e onde os tambores cobertos de pele de sucuri ainda são ouvidos - desde que o trem de minério de ferro não esteja passando na hora.
Eu também sou uma pessoa de livros. Desde muito jovem eu lia tanto que minha família não conseguia mais dar conta - já me pegaram lendo manual de geladeira porque os livros da casa tinham acabado. Minha vontade de ler e aprender (junto com uma criação privilegiada na classe média branca ludovicense!) me colocou na rota da ciência, e até o momento eu tenho uma formação acadêmica bem incomum: sou Bióloga pela UFMA, fiz o meu mestrado em Biodiversidade e Conservação pela Universidade Federal de Alagoas, e tenho um Doutorado em Ecologia Política/Estudos do Desenvolvimento pela Lincoln University, aqui da Nova Zelândia. Talvez você não conheça detalhes sobre essas áreas, então deixa eu te explicar: eu saí de estudar bichos, só ler e conhecer sobre aves, focar toda a minha energia em diagramas e números pra me jogar no mundo da Geografia, dos povos e comunidades tradicionais, suas lutas, seus ensinamentos, suas vitórias.
Eu também sou uma pessoa de críticas. Nessa coluna você pode esperar idéias desconfortáveis- eu vou te dizer, por exemplo, que eu sou contra o desenvolvimento; Vou te perguntar quantas vezes o vereador e o deputado estadual trabalham, e qual o papel dessas profissões. Vou te contar da poluição que sufoca quem mora na Zona Rural de São Luís, e do peixe cheio de mercúrio que você almoça no domingo. Vou te explicar que nossas cidades não estão prontas pros alagamentos, secas, vendavais que a crise climática está trazendo - e que a culpa não é do seu vizinho que joga lixo na rua, e sim de gente muito poderosa que adora ver o povo se culpando. É desconfortável, eu sei. Mas eu sou cientista, e depois de tantos livros e notícias e andanças e pesquisas, tá na hora de te contar o que eu aprendi.
Simbora?
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